by Daniela Carmo - 4 de Dezembro de 2018
Há mais de 40 anos, Jean-Philippe
Beau-Douëzy, ecologista e engenheiro consultor na área do ambiente, iniciou-se
naquela que viria a ser a sua luta pela conservação da natureza. Hoje, quer
continuar a plantar árvores nativas porque diz serem o futuro da humanidade. Há
11 anos que trabalha na Fundação Yves Rocher, em França, onde é administrador
do programa Plant for the Planet que consiste na plantação de 100 milhões de
árvores em vários continentes com o objectivo de combater a erosão do solo, a
perda de biodiversidade e recursos hídricos e para ajudar a agricultura local.
Jean-Philippe Beau-Douëzy, que esteve
recentemente no Porto, já percorreu vários pontos do planeta. Passou
pelo Sara, pelo Mediterrâneo, mas foi na Amazónia brasileira – onde chegou a
ser baptizado por índios – que ganhou um novo pressuposto: o de lutar pela sua
conservação. Em 1992, participou na Cimeira da Terra no Rio de
Janeiro, mas, antes disso, em 1978, já organizava um dos primeiros simpósios
com o tema Invenção Social e Ecologia Urbana, conceitos de que tanto se fala
hoje em dia.
Que questões se
discutiam em 1978 e que ligação têm hoje com as preocupações sobre a
sustentabilidade e a eficiência das cidades?
Interessante que a conversa é a
mesma. As questões são as mesmas, mudou a situação, que piorou. Por exemplo,
naquela época a situação do mar não era a de hoje, não tinha tanto lixo. A
situação na Amazônia não estava como hoje, estava muito menos desmatada,
claramente. Também a biodiversidade não tinha a loucura de desaparecimento de
hoje. As questões não mudaram, são as mesmas: o consumo de energia, o lixo. Por
isso, o importante é fazer e não discutir. Não é preciso falar mais, tem que se
fazer. Temos muitas áreas degradadas, muita terra degradada.
Como se aplica a todo o planeta uma
política capaz de gerir e conservar o ambiente?
A questão não é política, a questão
são as pessoas. A real pergunta é: será que as pessoas, hoje em dia, são
capazes de entender que têm que plantar uma árvore? Se cada humano neste
planeta for plantar uma árvore já vai mudar alguma coisa. Os políticos só falam
e acabou. A responsabilidade é de todos nós. Cada um pode fazer e tem de fazer.
Nesse contexto, até que ponto temos
de mudar a forma como vivemos?
Vamos ter de mudar e de nos adaptar
com certeza. Especialmente no ocidente, onde temos um gasto enorme e temos,
sempre, um consumo incrível. Há dois lados que têm de mudar: consumir menos e
melhor e mais produtos locais. O comércio local deve ser apoiado.
á reparei que em Portugal há muito a
tradição de ter uma horta em casa – isso é muito bom e tem de continuar, é um
bom caminho. Em França as hortas desapareceram. As pessoas compram verduras,
até as biológicas, no supermercado. Isso é um absurdo. As verduras que se
encontram no supermercado fizeram mil ou dois mil quilómetros para lá chegar e
isso é um gasto brutal para o ambiente.
Entre todas as problemáticas
ambientais, qual é a que mais lhe interessa? Porquê?
Hoje em dia, o que mais me interessa
é realmente a plantação de árvores porque o futuro da humanidade vai depender
delas.
Sabemos que as mudanças climáticas
existem e que têm efeitos na corrente do Golfo, efeitos visíveis. Estas
mudanças climáticas e outras atividades humanas têm um efeito incrível na
qualidade do solo, da terra, mas nós precisamos dela para nos alimentar.
Temos perdido muita terra por causa
da erosão e da salinização dos solos e o que pode proteger e reconstituir a
terra são as árvores. Elas são a verdadeira fábrica do solo. Hoje,
continuamos a fazer a desflorestação e a monocultura da plantação de árvores –
o que não presta, nenhuma das duas. Nenhum dos casos vai ajudar e ainda piora
se usarmos árvores como pinheiros ou eucaliptos. As folhas do eucalipto têm um
processo de decomposição muito lento e vão deixar a terra em más condições a
longo prazo. Devem ser plantadas árvores nativas porque estão adaptadas ao
solo. É preciso plantar uma árvore no coração das pessoas.
Acha que a tecnologia vai alguma vez
conseguir vencer tudo aquilo que as árvores nativas fazem pelo nosso planeta?
A solução não é a tecnologia. A
tecnologia está na moda e parece que vamos consertar a natureza com a
tecnologia. Só que a única coisa que conseguimos fazer com a tecnologia foi
acabar com muito do ambiente. Ainda temos muito a aprender com a natureza. Isto
não quer dizer que a tecnologia não possa ajudar, mas a primeira coisa é
estudar. Ainda não estudámos todos os pontos de como funciona uma floresta. As
árvores são capazes de fotossíntese e nós não conseguimos replicar isso com
tecnologia, até agora. Fazemos painéis solares muito poluentes, com muitos
gastos. Não há comparação com o que faz a natureza. Além disso, é preciso
perceber que o que é mais barato para parar o CO2 [dióxido de carbono] são as
árvores.
O fator econômico também é, por
isso, importante?
Hoje em dia também tem de se
considerar esse ponto. Mas não podemos pensar que vai ser só crescimento
econômico. Por exemplo, os eucaliptos têm uma saída econômica muito fácil que é
o fabrico de papel. Mas, a longo prazo, será que necessitamos de mais papel?
Temos tanto papel no planeta que podemos reciclar. Os eucaliptos não vão
conservar o solo e é preciso ver se há outras culturas que se possam encaixar
de um ponto de vista mais ecológico.
Defendeu, durante
muitos anos, a preservação da Amazônia e continua a fazê-lo. Como encara que
possa vir a ser o seu futuro com Jair Bolsonaro no poder?
No Brasil há grandes empresas de
agricultura e a bancada ruralista é muito poderosa. São essas grandes empresas
que fazem o desmantelamento da Amazónia. Isto não vai mudar porque Lula também
não fez grande coisa pela Amazónia. As empresas vão continuar a desmantelar a
Amazónia, a menos que haja uma pressão internacional. Mas não chega essa
pressão ser dos políticos, tem de ser das pessoas. A questão na base é a do
consumo porque o voto, hoje em dia, não quer dizer nada. O verdadeiro voto
prende-se com aquilo que você vai comprar e isso é o seu voto quotidiano.
Texto editado por Teresa Firmino
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